O artista
Vejo-te nos teus desenhos. A morder a língua na tua concentração. Feliz. Mais tarde a esfregar a cabeça como que libertando ideias aprisionadas. Vejo-te novamente criança, tímido, a dizer com tristeza que pensavas coisas que os teus colegas nunca pensavam.
Vejo-te crescer numa solidão que te foi dura, colmatada apenas pelo mundo imaginário que construías. E que moldavas. Mais tarde reescrevias.
Vejo como desabrochaste. Como ferido por demasiada sensibilidade, sobreviveste e te tornaste um artista. Como transformaste ideias, lampejos do teu imaginário, em imagens de profundidade e beleza que todos apreciam.
Vejo como os teus 25 anos jovens, mas maduros, abarcam uma cultura que a alguns assusta porque, anquilosados nos seus anos mal vividos, não aceitam que os ultrapasses. E nada é mais fácil do que apelidar-te de imaturo, ignorar a tua obra, e abusar da tua complacência, que te leva a partir do princípio que somos todos boas pessoas.
Vi-te ontem feliz, sensato, a usar a palavra oral como tua aliada, o tímido que enfrentou o público do seu primeiro filme com o orgulho da missão bem cumprida.
Uma vitória amarga, eu sei, um parto doloroso, mas a “criança”, a obra, está viva e recomenda-se. E realizaste o teu sonho. O resto são pormenores…
Como tu disseste ao teu público, “abracem um projecto, acreditem nele, e levem-no até ao fim”. E todos acreditámos e, depois do que vimos, soubemos que temos razões para acreditar.