sexta-feira, 30 de dezembro de 2016

DOR

Na economia do movimento, tentativa de limitar a dor, anseio pelo silêncio do corpo. Tomo consciência que a paz advirá da conquista do aqui e agora, da compreensão do quanto preciso de abrandar.


segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

MUROS

Perdeste as quatro paredes, onde o choro era soberano, e mostraste-te ao mundo. Mas não sabias como fazer e os muros voltaram. Aprenderás, com o tempo, como os fazer cair.


domingo, 18 de dezembro de 2016

DETALHES – II

Prendes-te nos detalhes. E se às vezes isso te desfoca, consumindo-te nas entrelinhas, noutras traz-te o que realmente vale a pena.


quarta-feira, 14 de dezembro de 2016

CORES - II

Aprendi a amar as cores nos mosaicos, na destreza do alicate naqueles pequenos quadrados, nas sobras com que eu brincava. Pedaços de memória, tão entrecortados como os mosaicos devolvem a cor aos dias cinzentos.

Painel de Dario Boaventura (fotografia de Mário Gomes)

domingo, 11 de dezembro de 2016

Árvore de Natal

Acendem e apagam as luzes da boa vontade. Ficamos mais leves, baixamos a guarda. Por pouco tempo. Porque isso do amor ao próximo é como as luzes da árvore de Natal.





quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

Primavera no Outono

Seria o tempo do repouso, prelúdio da regeneração. A natureza troca as voltas à natureza e eis que irrompe quando devia repousar. E o vigor do verde, embalado nos rebentos, conquista o castanho avermelhado do Outono. 


domingo, 4 de dezembro de 2016

HOMÚNCULO

Se dúvidas tivesses quanto ao poder das mãos, bastava-te recordar o quanto o cérebro investiu nesse delicado instrumento.
Olho-as: pequenas, hesitantes. Será que lhes faço confiança? Saberão distinguir os pontos, contraturas, dores? Saberão sentir as mágoas?






terça-feira, 29 de novembro de 2016

RESISTÊNCIA

Resistem as últimas folhas, num fulgurante vermelho, à espera de um abandono de vento. Quase nua, mantém a imponência, conquistando a luz.


quinta-feira, 24 de novembro de 2016

Gaivotas na Rotunda

Tomaram conta do jardim: cansadas do mar? Ou deixaram-se encantar pelas cores do Outono?




quarta-feira, 23 de novembro de 2016

ESTRANHEZA - III

Entranhado das ruas onde já não passava, estranhava as ruas que lhe deslizavam os pés.
De nada adiantaria o regresso porque agora os pés eram de lugar nenhum.


sexta-feira, 18 de novembro de 2016

SILÊNCIO - IV

Aprender o silêncio até que ele se entranhe. Até que as palavras, desnecessárias, abandonem a voz. Enredadas no pensamento, habituadas à liberdade da pronúncia despropositada, tentarão sair: água nos olhos, traições da face, impaciência dos gestos. Aceitarão a aridez do papel. Até que se aceitem inúteis e se deixem embalar na clareza do pensamento.


terça-feira, 15 de novembro de 2016

OUTONO-VIII

Por mais que eu conheça o teu rumor de folhas caídas, o nevoeiro entranhado na cidade, a noite precoce no decréscimo dos dias, haverá sempre o encantamento das cores com que desnudas as árvores, e uma surpresa na luz com que apagas os dias.


 





sábado, 12 de novembro de 2016

DESPEDIDA- VIII

Oiço noutras palavras, noutra despedida, o mesmo cansaço, a mesma ansiedade pela partida adiada. As outras palavras construíram um poema, na canção que me comove, as tuas gravaram-se-me na alma.

Escultura de Dario Boaventura

quinta-feira, 10 de novembro de 2016

ESCRITOR - II

Disse que já não escrevia. E as palavras, zangadas de abandono, assaltaram-lhe a manhã. E a urgência do papel.


segunda-feira, 7 de novembro de 2016

CORAÇÃO-II

Foi à loja para trocar o coração. Por um que sentisse menos. Que não estivesse ao pé da boca. Ou, melhor ainda, um longe dos olhos abandonados à água. Afinal, trocava-se tanta coisa!
Disseram-lhe que os transplantes eram assunto sério: artérias entupidas, enfartes, coisas do género. Que voltasse nessa altura.



domingo, 6 de novembro de 2016

PERSPECTIVA

Não chegaste aqui para teres uma única perspectiva do mundo. Para isso, seria mais fácil teres nascido noutro sítio.
Em tudo há uma união, um sentido, que te cabe descobrir. E nessa fusão de realidades compreenderás as diferenças. 


terça-feira, 1 de novembro de 2016

OUTONO-VII

Estas folhas ainda são bonitas. Caíram. Mas a luz que as recebe, num subtil movimento, preserva a harmonia da essência.




domingo, 30 de outubro de 2016

ABRAÇO

Abraço-te. Contigo não há abraços indiferentes. Porque sinto, na imaterialidade dos braços que me envolvem, toda a energia da terra.


quarta-feira, 19 de outubro de 2016

BERGAMO

Já tinha estado aqui e não te conhecia. Porque fiquei nos arredores, descurando o âmago: a cidade alta. Saindo do teleférico ofereceste-me as ruas estreitas, o duomo, as varandas de flores, a vista perdendo-se na cidade.
















domingo, 16 de outubro de 2016

Yin e Yang - III

A ideia de que o absoluto não existe: ou que resulta de partes que se complementam; às vezes, contradizem-se. Não há melhor nem pior, e uma não é nada sem a outra. Brilhante maneira de ver o mundo, na sua transitoriedade, nos ciclos que fazem da vida o eterno deslumbramento. Sem chuva, perderíamos o odor da terra molhada. O nevoeiro, traz-nos a ânsia do sol, hidratando as mucosas. O vento agita o cabelo e descabela as ideias. Segue-se-lhe uma quietude que as acalma.
Acarinho esta nova forma de ver a vida.




quinta-feira, 6 de outubro de 2016

ATENAS

Caminhar nestas ruas, nesta mistura de sons e cheiros, traz-me saudade da cidade de onde vim. Nos prédios em ruínas, no lixo entranhado dos pavimentos, na abundância de pichagens, num cenário  de pós-guerra de uma guerra que não houve, invade-me o privilégio de viver no Porto.










sábado, 1 de outubro de 2016

Gatos gregos

Os gatos gregos são simpáticos. Aproximam-se, roçam-se, dão-se aos carinhos, como se fossemos velhos conhecidos. Os cães também nos saúdam, quando não estão na sombra, placidamente adormecidos. Os humanos nem por isso: na maior parte do tempo parecem zangados com o mundo.