sábado, 30 de novembro de 2013

MOMENTO

Permanecer ao teu lado. Na respiração. Sentir o teu odor que se entranha na minha pele. Suspensa no momento.

sexta-feira, 29 de novembro de 2013

INFLAMAÇÃO

Vivemos rodeados de microrganismos, com um pacto de não-agressão benéfico para ambas as partes. Se as fronteiras forem respeitadas, tudo funciona.

Aparentemente esta é a receita para o sucesso, mas a nossa extrema desconfiança, o nosso medo de perder o controlo, levou-nos à posse de um poderoso arsenal de guerra. Para o que der e vier.

Assim, qualquer intromissão para além do aceitável, é vista como uma ameaça terrível, e a ela reagimos com a vasta panóplia dos mecanismos de defesa. Um intrincado processo chamado inflamação.

Mais do que com a ameaça, padecemos com a cura. As armas de destruição maciça deixam-nos num estado lastimável, obrigando-nos a recorrer a vários fármacos.

Apesar dos efeitos colaterais, este mecanismo de sobrevivência trouxe-nos até aqui. Se calhar por isso o repetimos, à escala global, como espécie, parafraseando o conhecido adágio – a melhor defesa é o ataque. E não olhamos a consequências.

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

ROSTOS - II

Alguns, morosos, revelam todo um trabalho de retoque. Outros, rápidos, espelham manhãs breves, mas nem por isso menos bonitos.

São passado, em olheiras mal disfarçadas ou em rugas ostensivas, pele curtida nas intempéries do desgosto. São presente, em olhos sorridentes e interrogações vãs.

Pinto este quadro com palavras.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

As palavras - V

As palavras interrogam-me. Mas só as lágrimas respondem.

Ecoam gritos de mágoas passadas. Silenciam-se no abandono.

Perplexa,  a alma voou.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

SAÚDE - II

A saúde é um estado transitório que não inspira nada de bom. Outra das frases preferidas do meu pai, memorizada das suas leituras.

Parecemos viver numa eterna corda bamba, prontos a cair, inexoravelmente, e sem aviso prévio, nos ardis da doença. A verdade é que somos mais resistentes do que pensamos.

Transportando mais bactérias do que células, o nosso corpo parece a receita certa para o desastre. Um vulcão, pronto a entrar em erupção. No entanto estabelecemos com os microrganismos um pacto de não-agressão. E, na maior parte dos casos, as fronteiras são respeitadas. Situação favorável as ambas as partes, pois não adoecemos (recebendo mesmo algumas benesses destes simpáticos viajantes), não sendo abalado o corpo que tão placidamente os sustenta.

sábado, 23 de novembro de 2013

ÁGUA

Volto à água. Berço de todas as emoções.

Repetidamente mergulho na amálgama de sensações. E de sons.

Apaziguo a origem.







quinta-feira, 21 de novembro de 2013

terça-feira, 19 de novembro de 2013

Meia-pessoa

Cruzou-se comigo. Meio-corpo, na cadeira de rodas. Conversava normalmente, com quem empurrava a cadeira.

Sem metade de si, não era meio-homem. E foi esse rasto que deixou.

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

ESTRANHEZA

As pessoas são muito estranhas.

Algumas parecem mudar de humor quando mudam de roupa, de tal forma que nunca sabemos quem são.

Outras andam às voltas, redondas, e não conseguem comunicar.

domingo, 17 de novembro de 2013

ESCREVER - IV

Sinto, em cada dia que passa, que cada vez menos me pertenço. Possuem-me as palavras, as imagens, os sons, excertos de conversas. Esboços de personagens povoam o meu sono.

sábado, 16 de novembro de 2013

OUTONO

As árvores não vestem a mesma cor nos dias sem sol. Por isso, nesta solarenga manhã de Outono, inebrio-me.





DEGRADAÇÃO

Não sei quando o corpo deixa de nos pertencer. Em que momento da lenta degradação, implacável, nos afastamos para sempre. Quando a lucidez se torna tão dolorosa, que qualquer fantasia é válida.

O que somos então? Aos olhos de quem nos cuida, aos nossos olhos?

quinta-feira, 14 de novembro de 2013

NOSTALGIA - II

Coloquei este colar e lembrei-me de ti. Pedaços da nossa vida se agarraram ao azul da pedra. E, por momentos, fui os dias felizes.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

Meias e caixas

À primeira vista não há qualquer relação entre as meias e as caixas herméticas. O que é certo é que em ambos os casos, os pares se desirmanam. Por um qualquer inexplicável fenómeno, tenho caixas sem tampas, e tampas solitárias, inadaptadas para as caixas que restam.

O mesmo acontece com as meias. Almas gémeas, que de forma indiferente se colocam à esquerda ou à direita, ficam sozinhas, à espera de um cada vez mais longínquo casamento.

Sem relação aparente, é todavia um facto comum a vários lares, pelo que se supõe a existência de uma explicação. Sempre gostei que as coisas tivessem explicação. Mas não tenho uma bola de cristal que me identifique o rasto destes objectos. Nem que desvende a estranha magia que leva a que desapareçam em conjunto.

terça-feira, 12 de novembro de 2013

DESPEDIDA

Vou dar-te um beijo, disse-lhe.

Ficou à espera. E o tempo consumiu-se em dias amargos. No Inverno que chegava, o coração enevoou-se.

segunda-feira, 11 de novembro de 2013

As palavras – IV

As palavras andam por aí, à procura de um enredo.

Ainda não são uma história, ainda não se abraçam numa fluida narrativa.

Precisam de tempo. Aguardam.

sábado, 9 de novembro de 2013

quinta-feira, 7 de novembro de 2013

ACORDAR

Acordo como se tivesse areia nos olhos. Imagino que secura habitará o meu cérebro.

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Mata de Albergaria – II

Abraço do verde nos troncos emaranhados. No tapete de fetos nasce o castanho. Humidade, onde reinam cogumelos. Chovem cascatas onde o tempo se sustém.













terça-feira, 5 de novembro de 2013

ESCREVER - III

Escreve. Dilacera o papel. Para que na cabeça se faça silêncio. E a voz seja suave.

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Dias de chuva – II

Não sei se os dias de chuva são tristes ou se a chuva vem porque o dia acorda triste. Mas é sobretudo nesta ausência de sol que a melancolia me aprisiona.

domingo, 3 de novembro de 2013

Cascata do Tahiti – II

Ser parte desta água. Correr sem destino, poderosa e todavia serena.

Estremece-me o odor do musgo. Gotículas de água refrescam-me em efémeros arco-íris.

Contemplo. A força deste som cala todas as vozes.






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sábado, 2 de novembro de 2013

A raiva

A raiva tem palavras afiadas. Que magoam onde o coração se faz tranquilo. Onde, nos dias de chuva, a cicatriz volta a doer.


sexta-feira, 1 de novembro de 2013