sábado, 31 de janeiro de 2015

PALAVRAS – XI

Esperou que ele falasse, certa de que a próxima palavra seria a palavra mais próxima. Mas foi a mais distante: adeus.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Da natureza

Da natureza: as coisas simples. As flores desabrocham fruto do ser, tributo ao sol. Pouco lhes importa se são as mais belas. Tão pouco isso importa à outras flores.


Saudação ao sol



Saudamos o sol neste morrinhento dia de chuva. Agradecemos a sua presença mesmo quando não se mostra. Não há melhor maneira de começar o dia.


quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

SES

São demasiados ses. Penduram-se-lhes possibilidades, enredadas umas nas outras, que abalam a tranquilidade. Mas são os mesmos ses que abrem portas, que trazem ideias, e que nos permitem sonhar.


PROJECTOS - III

Sinto-me um autómato, adormeço e acordo a pensar no mesmo, não sinto necessidade de comer ou sono (há sempre um ansioliticozinho ao alcance para umas horas de descanso nocturno). Sou alguém que não conheço, dirigida a um objectivo. (Será que é assim o treino militar?)

Mas, em intervalos a que me obrigo, lendo histórias de outras vidas, a emoção regressa de forma abrupta, revela a inutilidade das minhas preocupações, e traz-me a paz que julgava perdida.


domingo, 25 de janeiro de 2015

DIÁLOGO

Diz uma:
- Sabes, o … (figura pública à escolha) faz exercício físico três vezes por semana: anda a cavalo.
Responde o outro:
- Quem faz exercício físico não é ele, é o cavalo!

sábado, 24 de janeiro de 2015

ÓCULOS - II

Não gosto de comer com óculos. Apesar da mais-valia que representam (sem eles já não vejo as espinhas) sinto que me atrapalham. É só tirar os óculos e a comida ganha outro sabor.



sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

CAMINHO

Percebes que estás no bom caminho quando te alegras com as coisas simples. Quando aparentes derrotas trazem pequenas vitórias. Quando já não és impelido para responder a tudo o que dizem. Quando, mal dormido, agradeces teres mais tempo desperto.


quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

DIFERENÇAS - II

Há todo um mundo dentro do teu mundo. E eu fico à porta. Espero que ela se abra: na paciência deste amor. Porque agora, quando te olho, tudo está bem. É aos outros olhos que pareces avariado.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

PROJECTOS - II

Como o estômago, a mente precisa de variar. Dêem-lhe sempre o mesmo e ela deixa-se abater por um fastio entediante recusando-se ao mais pequeno laivo de criatividade. É por isso que lhe vou dando, em pequenas doses, outras leituras.


MEDITAÇÃO - II

Usamos a palavra meditar como sinónimo de pensar ou, melhor, reflectir. Significa, quando dizemos que vamos meditar sobre um assunto, que vamos seriamente ponderar sobre ele. Atitude aparentemente  mais responsável do que o leviano - “Vou pensar nisso” – muitas vezes dito como quem despacha o interlocutor.

Mas, na verdade, meditar significa esvaziar a mente de qualquer pensamento.


segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

EMIGRAR

Mais do que das ruas e das gentes, do que do cantar da língua, sentiria saudade deste sol. E do mar.

Como dizia uma holandesa que eu conheci, alguns meses depois de cá estar, e num Junho que se quis chuvoso: “Compreendo agora porque vocês ficam de mau humor quando não há sol”.




sábado, 17 de janeiro de 2015

PROJECTOS

A Mia vem e, das duas, três: ou quer escrever por mim, ou passeando pela frente do écran, não quer de todo que escreva, ou veio para aqui num gesto felino de solidariedade.








quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

SILÊNCIO-IV

Gastava as palavras à toa. Fluíam como os pensamentos, transbordavam-na de forma célere. Jogava-as fora. Com o tempo percebeu que o silêncio era a melhor das conversas.

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

No metro - V

Há um passarinho na linha. Saltita, pára, olha este gigante de ferro que se lhe atravessa no caminho. Hesita. Abre as asas e recupera a liberdade.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

MEDITAÇÃO

- Não pensar em coisa alguma.
Como não pensar se tentar não pensar é, em si, um pensamento? Fecham-se os olhos e logo o cérebro se encarrega de tentar enumerar tudo o que se tem de fazer a seguir. Imagens. O truque é concentrar-se numa imagem bonita. O pôr do sol. Uma flor. Mas o cérebro não desiste e rapidamente saca do arquivo imagens soltas, descontextualizadas, que já não se sabe onde pertencem. E entretém-se nos minutos seguintes a tentar conhecer-lhes a pertença.


sábado, 10 de janeiro de 2015

SERENIDADE

Sabia (tinham-lhe dito das mais diversas formas e feitios) que a serenidade dependia dela. Conhecia textos bonitos, técnicas de relaxamento, conselhos de amigos. Mas, quando ele bateu com a porta, o deserto invadiu-a.


sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

PACIÊNCIA

Qual é a dose de paciência que um ser humano deve albergar? E essa dose deve ser distribuída de forma equitativa? Haverá um limite com o que se gasta com cada pessoa?

Provavelmente, como na culinária, o conselho será: quanto baste (q.b.). O que torna a receita complicada, de tão arbitrária.

quinta-feira, 8 de janeiro de 2015

Sentir-se em casa – IV

Sou esta cidade. Respiro as ruas, ouço-me no sotaque, demoro-me no mar. Sou este rio. De ouro: dizem.









As palavras - X

As palavras não doem todas da mesma maneira. Podem ter as mesmas letras, entoação, intensidade, mas importa de onde vêm. É daí que vem a ferida.

quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

A vogal

Consoante a presença ou ausência de til a vogal anasala ou cura a sinusite. Por isso se diz que a língua portuguesa é muito traiçoeira.

terça-feira, 6 de janeiro de 2015

LÓGICA

Mal está o mundo quando nem o computador age com lógica. Quando, parco de memória, na eminência da eliminação de ficheiros, usa um qualquer critério esotérico que minha ilógica mente humana não consegue entender.





segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

IMAGENS - VI

Assim são as imagens. A superfície de Vénus, uma pintura, um rosto. Descubro todo um outro mundo neste mundo de texturas, neste transfigurado tronco de árvore.











domingo, 4 de janeiro de 2015

PASSADEIRAS

- Esta passadeira é perigosa – disse ela, quando o carro quase não parara.
- Todas as passadeiras são perigosas – respondeu ele.

Era verdade. Atravessa-se com base na confiança, no acordo tácito de que o veículo nos cede a passagem. Mas o outro, poderoso no seu deslocamento rápido, não está lá para nós.


sábado, 3 de janeiro de 2015

Sol e sombra

Não fosse o sol e nunca veríamos a sombra. Ficaríamos pobres de contrastes. 

















À mesa

Diz o primeiro:
- Isto é peru? Outra vez? É seco.
- Não. É porco. Ou porca. – Diz a cozinheira.
- Mas, ao que consta, era muito amigo de um peru. – Remata o filho.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2015

DOENÇA – II

O que a doença faz a um homem... No rosto só o olhar permaneceu. Foi aí, entre rugas e tremuras, que o senti familiar. Depois veio um nome que não encaixava naquela magreza, na hesitação do andar, na tristeza dos dias.

quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Ano Novo - IV

Dizem que esperavam cem mil. E que afinal éramos mais. E já nem frio se sentia, um mar de gente, ondas de amigos. Saltaram rolhas ainda antes do fim do ano, muitos contavam passas que punham na boca. Um casal tinha mesmo uvas frescas; passado era o ano. Lidavam com o problemas de quando as pôr na boca, porque eram grandes: uvas brancas.

Contagem descrescente. Votos de Bom Ano, beijos, abraços. Dos recônditos da memória lembro-me do David, pequenino, que repetia (como percebia) os votos de Bom Ano: eu amo, eu amo.

E o fogo, que do escuro, liberta o esplendor da minha cidade.