Onde é que estão as minhas calças pretas? Pergunta um. Já foram para lavar? Alguém as arrumou no armário errado? Continua o mesmo. Vem outro e diz: “ Emprestas-me os teus calções cinzentos que tenho agora educação física?”
Uma família com três filhos é, sem dúvida, uma família numerosa. Um deles até já me disse: “Não sei onde tinhas a cabeça quando resolveste ter três filhos!”
Eu sei onde tinha a cabeça. Na minha infância. Na casa dos meus primos, naquelas cinco crianças com quem partilhei tantas brincadeiras, e não menos asneiras. Filha única, entrava naquela casa com jardim como se entrasse no paraíso.
Tive direito a histórias de meter medo, a assistir à administração de aspirinas a rãs, porque tinham mesmo ar de estarem com dor de cabeça, a ver galinhas, porquinhos-da-índia e cágados no quintal.
Havia um frigorífico imenso onde ao fim de semana descansavam litros de iogurte. O empadão de pão com queijo e fiambre. Os tabuleiros da fruta.
Impregnei-me daquela camaradagem, daquele universo partilhado. Até hoje. Surge novamente diante de mim quando um dos meus filhos indaga pelas calças pretas.